sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

MEDIA CRITICISM

Capa do livro "As Lutas, a Glória e o Martírio de Santos Dumont", do jornalista e escritor Fernando Jorge
O sexo dos anjos Pois é... Nesta semana (22 a 27 de fevereiro), por duas vezes, fui telespectador e leitor de duas baboseiras acerca de um de nossos maiores heróis, Alberto Santos Dumont. Trocadilhos à parte, duas eminências, um político federal (ou estilista-deputado) e um conceituado jornalista discutiram em público o sexo dos anjos (resguardadas as devidas comparações). Na terça-feira de carnaval, dia 24, o deputado federal Clodovil Hernandes (PTC-SP) foi o convidado de Silvio Santos no programa “Nada Além da Verdade”, do SBT. Em duas oportunidades, o maior (e único) estilista da Câmara Federal abordou, além de outras bobeiras, a questão da sexualidade e citou três “gênios homossexuais” da história universal: Leonardo Da Vinci, Michelangelo e Santos Dumont. Vindo de Clodovil, não é de surpreender. Mas... Gênio pode. Agora, homossexual??? A outra surpresa veio na página 37 da revista Veja de 25 de Fevereiro (Ed. Nº 2101), na coluna Radar, do jornalista Lauro Jardim. Sob o título “Discussão lateral”, a nota comentava sobre uma carta que estava há décadas guardada sob sigilo pela família do Pai da Aviação e que será usada como “prova da masculinidade” de Santos Dumont em uma nova biografia, de autoria de Cosme Drumond, sobre nosso maior inventor. Segundo a coluna, o livro deverá contestar a tese do americano Paul Hoffman, autor da biografia “Asas da Loucura”, onde afirma que Dumont era homossexual. Na falta de assunto, em tempos de Big Brother, discutir publicamente se fulano ou cicrano é gay ou não, sempre rende uns trocos e audiência. De fato, Santos Dumont acabou se tornando uma figura polêmica na história, acredito, pelo simples fato de ser brasileiro. Afinal, uma invenção tão genial, que mudou para sempre a história dos transportes, não poderia, jamais, partir de um indivíduo nascido em um país tão atrasado (para os parâmetros da época). Não é a primeira vez que nosso Alberto é atacado por norte-americanos. Veja-se a polêmica sobre os irmãos Wright e as críticas feitas pelo jornalista Barth Schwartz, publicadas certa vez na Folha de S. Paulo (Schwartz nasceu em Dayton, Ohio, cidade natal dos Wright) e comentada pelo jornalista Fernando Jorge em sua coluna semanal “Bate-papo com o leitor”, no Grupo JBA – Jornais Associados. E o mais engraçado é que nas rodinhas de discussão sobre Santos Dumont, o assunto principal gira em torno de sua sexualidade. Tudo porque um americano disse que ele era gay. Bem feito! Quem mandou nascer no Brasil? Ainda o escritor e jornalista Fernando Jorge, um dos mais eminentes biógrafos brasileiros da atualidade, lançou em abril de 2007, através da Geração Editorial, a 5ª edição, revista e ampliada, de sua biografia sobre Santos Dumont, “As Lutas, a Glória e o Martírio de Santos Dumont”. Ao contrário de Cosme Drumond, Fernando Jorge é um perito em biografias detalhadíssimas e fartamente documentadas. Em seu livro, Fernando Jorge menciona algumas paixões que marcaram o coração do aviador, todas do sexo feminino. Entre elas, uma cubana, Aída de Acosta, a quem o inventor ensinou a pilotar um de seus dirigíveis. Houve rumores também sobre um possível romance com uma cantora francesa e ainda um amor platônico por uma menina de 17 anos, Janine Voisin, filha do aviador francês Gabriel Voisin. Dumont, então com 53 anos, pediu a mão da moça em casamento quando, claro, não foi atendido. Vale ressaltar que essas afirmações contidas no livro de Fernando Jorge não são suposições, são fatos documentados. Por esta obra, o jornalista ganhou dois prêmios: o diploma Pioneiros da Aeronáutica, da Fundação Santos Dumont, e o diploma e a medalha Ordem do Mérito Aeronáutico, concedidos pela Comissão de Alto Nível do Ministério da Aeronáutica, durante a gestão do brigadeiro Paulo Salema Ribeiro. Além disso, a biografia de Dumont, por Fernando Jorge, é tão recheada de detalhes e documentações, que acabou servindo de base para uma cinebiografia a ser produzida em Hollywood, dirigida por Baz Luhrmann (“Moulin Rouge” e “Austrália”), cujo contrato, segundo o escritor, já foi assinado. Outras biografias menores e menos detalhadas revelam as mesmas informações. A biografia “Vida de Santos Dumont” (1935), da historiadora Ofélia Inarbal Fontes, também menciona essas paixões do filho de Cabangu (MG), município hoje rebatizado de Santos Dumont. Voltando á vaca fria, a coluna “Radar” do Lauro Jardim na revista Veja, coroar de ineditismo a constatação de que Santos Dumont não era homossexual é um exagero, para não dizer desinformação. Se por um lado o inventor mineiro não era visto em companhias femininas com frequência e nunca se casou, por outro também nunca houve qualquer boato sobre qualquer relação homossexual envolvendo nosso herói.Considero absolutamente ridícula e desnecessária uma obra, que se propõe biográfica, pautar-se focada numa correspondência que venha a provar a sexualidade de qualquer pessoa. E mesmo que fosse o caso, a homossexualidade de Santos Dumont, isso nunca o isentaria de seus méritos, de seu status de um dos maiores orgulhos de nosso País.

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